O feedback como ferramenta de eleição do treinador de futebol

Todos os fins-de-semana, sempre que a minha disponibilidade o permite, compareço nos mais diversos campos da nossa região e assisto a jogos de crianças e jovens, comportamentos nas bancadas e também dos agentes desportivos em campo.  Não pude ficar indiferente, ao comportamento/forma de estar de um treinador de traquinas no decurso de um jogo, onde o mesmo perante as acções de decisões de insucesso individual e colectivo da equipa que orientava verbalizava de forma reincidente o calão típico do futebol em adultos: “Dasss…P…ta que …ariu”, “Sempre a mesma …erda” .  Contei mais de duas dezenas de repetições destas palavras, perante um assistir de normalidade dos pais na bancada, como se tratasse de algo culturalmente aceite.

Não pretendo com esta crónica, de forma alguma, estabelecer algum tipo de crítica ou desrespeitar o (des)treinador visado, pretendo antes evidenciar que quem pensa que só perceber de tática é que vai ter sucesso no mundo do futebol. Os  treinadores estão a liderar com crianças e jovens num contexto específico que é o futebol de formação. O feedback dado no timing certo e com o vocabulário adequado é uma peça chave para se alcançar o sucesso. Quando se lida com crianças, entre os 6 e os 12 anos de idade, é necessário que os atletas vejam o treinador como alguém que é uma amigo, que estes possam sempre contar não só no futebol como também em questões pessoais. Tudo isto começa no feedback que se aplica no treino, que transmitimos para o jogo e que nos vai aproximar cada vez mais do atleta.

Nos momentos das falhas, da frustração e de tristeza por parte de um jovem jogador, é quando o treinador tem de aparecer e dar o feedback positivo e assertivo. É o timing certo, onde deve saber o que vai dizer, como o vai dizer, com que sensibilidade o vai fazer para conseguir que numa situação futura as acções e decisões do atleta vão melhorar. Há várias maneiras de motivar uma criança, mas nunca o será certamente com o uso de vocabulário depreciativo de diminuição. Um atleta a quem as várias acções de um jogo tenham corrido mal é aquele que tem de receber mais apoio no treino e mais incentivo por parte do treinador. Sem hipocrisias, os jogadores não são todos iguais, o “mister” tem de saber diferenciá-los de uma maneira discreta e tem de saber lidar com um atleta que tem um ego muito elevado e com um atleta que seja mais tímido.

Não vejo problema quando o orientador fala de forma mais “bruta” com os atletas, seja mais “agressivo” no uso da voz, contudo, vejo grandes problemas no tipo de vocabulário utilizado junto de crianças e jovens. Pronunciar-se em tom de voz alta, “bruta” e “agressiva” com vocabulário ético pode até ser um a forma do treinador demonstrar a sua autoridade e não quer dizer que não gosta do menino, muito pelo contrário, é sinal de preocupação, tal e qual, como pais, fazemos no contexto familiar. Se exigimos regras no contexto familiar também se têm de incutir no contexto desportivo.

Acima de tudo, é importante que o treinador no futebol de formação, essencialmente, tenha uma sensibilidade muito grande para ter os jogadores todos do seu lado e que, ao mesmo tempo, consiga ensinar e transmitir os mesmos valores, comportamentos e gestos de um futuro adulto exemplar. Se o treinador não tiver a consciência do peso da ferramenta que tem o feedback que utiliza, nunca terá certamente dificuldades em se tornar um treinador de eleição.